"Deus me respeita quando eu trabalho. Mas me ama quando eu canto."

terça-feira, novembro 04, 2008

Barack Obama X John McCain

OBAMA NO MEIO DE NÓS?

Blog Reinaldo Azevedo

Conversava no começo da noite com aquele meu amigo “obamista”, o dos e-mails da madrugada, e acabei dizendo: “É, a esta altura, talvez até eu torça pela vitória de Barack Obama. Pode ser até um bom remédio contra o antiamericanismo estúpido que toma conta do mundo. A eventual vitória de John McCain fará com que todos os imbecis do planeta imaginem estar certos acerca das boçalidades que dizem sobre os Estados Unidos”. Não, leitor! Eu não mudei. Continuo a torcer por McCain. Estava apenas fazendo uma espécie de, sei lá eu, desabafo quase irônico a respeito das eleições naquele país.

Enquanto escrevo, vocês certamente lerão nesta terça, cinco estados antes dados como conquistados por Obama entraram na categoria de risco (para ele). Outros dez (128 votos) estão indefinidos. Segundo o excelente site Real Clear Politics, a vantagem do democrata já foi maior: chegou a ter 311 delegados; agora, às 2h29 da manhã, informa a página eletrônica, está com 278 — precisa de 270 votos. Juntos, aqueles estados que passaram a trazer algum risco para Obama somam 50 delegados. Vamos ver como será quando vocês mesmos fizerem a consulta. Ninguém se atreve, pois, a dar a eleição de Obama como certa, embora ela seja bem provável. O resultado, espera-se, será conhecido hoje. O sistema americano, vocês sabem, pode permitir derrotas e vitórias homéricas, ainda que os candidatos tenham quase o mesmo número de votos. Basta que um deles ganhe, não importa por qual margem, a disputa num grande número de estados e/ou nos mais populosos, com mais delegados.

Vejam como é curioso: o mundo e boa parte dos EUA estão rigorosamente entre a euforia e uma espécie de depressão. Se Obama vencer, o país pode assistir a uma das maiores manifestações públicas de regozijo de sua história; se perder, então será como se as piores expectativas sobre os americanos se cumprissem. E, no entanto, vamos ver: que grande mudança institucional ou legal estará se operando ganhe um ou outro? Em qualquer hipótese, a resposta é NENHUMA. Vou repetir aqui: minhas reservas a Obama nada têm a ver com o seu suposto viés excessivamente “liberal” (entendido, nos EUA, como “esquerdista demais”). O que me afasta dele é sua óbvia inexperiência.

Ele está longe de ser um ignorante ou alguém intelectualmente limitado. Os republicanos, se vocês notarem, não deixaram de usar contra ele certos recursos que, no Brasil, curiosamente, têm um pé no petismo: chamam-no “elitista” e tentam ironizar a sua condição de “intelectual” e amigo do establishment de Washington. Não, ele nada tem de apedeuta — se gosto das coisas que ele diz, bem, aí são outros quinhentos. Mas não representa ou encarna a apologia da ignorância intuitiva. Ao contrário: é até bem metódico. O problema está nos sentimentos que mobiliza, aí, sim. É evidente que a euforia que pode se seguir à sua vitória decorre de virtudes que ele não tem nem terá: a de um verdadeiro “Salvador”.

O que me desagrada profundamente é a falsa “verdade” que se plasmou — e isso foi habilmente usado pela campanha democrata — de que só o racismo pode derrotar Obama. Isso, na prática, se daria assim: o eleitor diz ao pesquisador que vota em Obama — daí a sua liderança nas pesquisas gerais —, mas, na hora de escolher um nome na cabine indevassável, votaria contra “o negro”. Ora, o mapa do Real Clear Politics desmente essa hipótese. E é simples demonstrar: há 10 estados indefinidos (128 votos); em cinco outros (50 votos), tendentes a Obama, os pesquisadores vêem risco — vale dizer, a sua liderança não é consolidada. Assim, ainda que o eleitor esteja dizendo a verdade aos pesquisadores, qualquer resultado é possível.

Mas se firmou a “doxa”, não tem jeito. O processo foi conduzido de forma a que só um resultado parece legítimo, ou se instala sobre o processo eleitoral uma suspeita de má fé. E o que é mais impressionante: má fé do eleitor, o que certamente seria inédito na democracia. É como se um movimento coletivo fosse, então, organizado para enganar os pesquisadores. Vejam lá: consideradas as margens de erro, qualquer resultado é possível.

Meu amigo insistia, nesta segunda à noite, nas qualidades, vamos dizer, “conservadoras” de Barack Obama, o que acabou atraindo até parte dos republicanos tradicionais, alguns deles auxiliares do hoje já lendário Ronald Reagan. O “real McCain”, aquele independente, teria ficado para trás, obrigado que foi a entusiasmar o próprio partido e suas alas menos intelectualizadas, papel que inicialmente parecia caber a Sarah Palin, bem-sucedida no começo, esmagada depois por um trabalho de “desconstrução” como, creio, não se viu nos últimos tempos. De “fenômeno” a “estúpida”, passaram-se três semanas.

Não estou certo de que Obama seja o “real conservador”, como querem alguns setores que se descolaram do próprio Partido Republicano. Mas é certo que não o considero um revolucionário. A política e o establishment americanos dispõem de muitas instâncias que impedem o eleito de, vá lá, atingir o coração dos interesses dos Estados Unidos. Não me agrada é esse movimento de opinião salvacionista que tomou conta de seus eleitores nos EUA e de seus admiradores no mundo. E que se note: não me venham dizer que esse movimento é muito mais iluminado do que o dos “radicais” que inflamam os comícios de Sarah Palin. Dois obscurantismos de meras palavras de ordem estão em confronto.

À diferença de muita gente, não gosto deste momento da “democracia americana” porque acho que se formou uma opinião coletiva que agride a própria essência do sistema: só um resultado provaria as suas virtudes.

Mas também não me tomem por apocalíptico. Obama vai vencer? Então tá. De certo modo, é a pior coisa que pode acontecer para o próprio Obama e para aquelas fatias de seu eleitorado tomadas pelo “quebranto do bem”. O Messias terá de voltar à terra. E de ficar na terra.

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