"Deus me respeita quando eu trabalho. Mas me ama quando eu canto."

domingo, agosto 30, 2009

Ontem o adeus

Memória

O homem que salvou a si mesmo

Sem a glória trágica dos irmãos e eternamente perseguido pelo acidente que matou uma secretária, Ted Kennedy conseguiu se redimir

Vilma Gryzinski

Nascer homem no clã Kennedy significava vencer logo e morrer cedo. O fato de ter deixado o mundo dos vivos somente aos 77 anos, na casa em frente ao mar que adorava, depois do câncer lutar contra ele até ganhar a derradeira batalha, reflete tanto o fracasso quanto a glória do senador Ted Kennedy. Fracasso porque não chegou ao ápice, como John, nem perto dele, como Bob. Ao contrário dos irmãos, não tombou sob balas assassinas nem ascendeu ao plano dos heróis míticos. Em compensação, contra todos os prognósticos, conseguiu salvar a si mesmo, e aí estava seu grande feito. Cultivou uma carreira ímpar no Senado, derrotou a bebida, escapou da irrelevância e, por alguns momentos sublimes, entre o anúncio do câncer no cérebro, em maio do ano passado, e a eleição de Barack Obama, conseguiu que seu nome fosse pronunciado sem a associação ao episódio fatídico no qual perdeu a honra e a chance de vir a ser presidente. O nome estranho, Chappaquiddick, um lugar onde os ricos e chiques passam férias – perto de onde a família Obama estava quando chegou a notícia da morte do senador –, nunca mais desgrudou de Ted Kennedy. Era a noite de 18 de julho de 1969, a Apollo 11 estava a caminho do histórico passeio lunar. Belo como um Kennedy, bêbado como um irlandês e, tal como os irmãos, com moral sexual de imperador romano, o senador saiu de uma festinha com uma secretária loira, manobrou mal numa ponte tosca e afundou com o carro. Ela morreu afogada, ele chamou os advogados primeiro e a polícia nove horas depois.

Senador vitalício por obra dos eleitores de Massachusetts, tanto por suas ideias – melhorar os serviços públicos, aumentar o Estado, taxar os ricos e cultivar a aura de príncipe do povo – quanto pelo histórico épico, Ted Kennedy continuou carregando a imensa bagagem familiar. Estava numa boate com um sobrinho e foi com ele para a casa em Palm Beach onde uma jovem acompanhante acusou o rapaz de estupro. A filha dele teve câncer de pulmão. A primeira mulher, alcoolismo. Dizem que o próprio Ted foi visto fazendo sexo num restaurante de Washington. O segundo casamento, com Victoria Reggie, o ajudou a se aprumar e rumar para um lugar honroso na história. Obamista precursor, foi aclamado na convenção do Partido Democrata que consagrou a candidatura vencedora. Recém-operado do tumor no cérebro e submetido aos brutais tratamentos de praxe, conclamou os correligionários a "mudar a América, restaurar seu futuro, ombrear com nossos melhores ideais e eleger Barack Obama presidente dos Estados Unidos". Retórico demais, mas bonito como discurso de senador. Dos de verdade.


A matéria da Revista Veja escreve sob a foto de Ted Kennedy

"O GRANDE IRMÃO Kennedy: um senador de verdade"

Essa frase me fez lembrar o que Lucia Hippolito publicou em seu blog no dia do falecimento de Ted Kennedy em 26.08.09, que reproduzo abaixo.

"Edward Moore Kennedy

O maior senador do século XX

Pensei em escrever alguma coisa para homenagear o senador Ted Kennedy.

Mas sua biografia e sua atuação política são autoexplicativas.

Num mundo dominado por Sarney, Renan, Wellington Salgado e Almeida Lima, Ted Kennedy não teria mais lugar."

*

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