"Deus me respeita quando eu trabalho. Mas me ama quando eu canto."

sábado, novembro 03, 2007

Porque hoje é sábado, uma boa leitura

por Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa

O Envelope

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, num arroubo de entusiasmo juvenil, pediu ao presidente da FIFA, senhor Joseph Blatter, o envelope de onde esse último retirara o nome do país escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2014. Uma bela recordação do dia emocionante em que o Brasil foi confirmado como sede da festa máxima do futebol. Com certeza esse envelope é para ser guardado entre os maiores tesouros de Sua Excelência.

Fez ele muito bem. O tempo, o senhor da razão, ainda por cima é cruel. Passa muito rápido. Dentro de alguns anos, o que restará para o fã é aquele envelope e algumas fotos. O outro presidente presente – são muitos, aparentemente todo mundo gosta de ser tratado de ‘presidente’ – o brasileiro Ricardo Teixeira, guardará como recordação particular o momento varonil em que defendeu, com as mãos nuas, o Brasil do insidioso ataque de uma jornalista canadense. Sua tropa de elite particular, composta por nada mais nada menos que o Chefe da Nação, 12 governadores de Estado, 3 ministros e mais umas duas dezenas de acompanhantes, aplaudiu freneticamente seu gesto heróico. A audácia da jornalista! Perguntar, numa entrevista coletiva, sobre segurança no Brasil...

O governador de Minas Gerais levou em sua comitiva a fotógrafa oficial de sua corte, Soraya Ursine (fonte: Ancelmo Góes). Não precisava exagerar. Ele é, disparado, se me permitem o jargão do turfe num texto sobre futebol, 20 corpos de luz mais belo que os outros governadores. Qualquer fotógrafo lhe faria justiça. Mas não estou aqui para empatar a festa de ninguém, sobretudo depois do discurso mágico do escritor Paulo Coelho. Segundo o mago, 90 minutos de futebol rendem mais assunto que 90 minutos num bom motel e em boa companhia. Não discuto, mas creio que melhor do que falar sobre qualquer uma das duas atividades, o melhor é fazer.

Sei que estou sendo repetitiva. Todos leram sobre essa festa extraordinária na bela Zurique. Inclusive o Rei Pelé. Como ficou de fora, deve ter lido. E ficou de fora porque sua presença ofuscaria toda a delegação; por isso e por outros motivos insondáveis. O que não faz a menor diferença na ordem natural das coisas: sempre que se falar em futebol, seu nome será lembrado. Quando todos os vivos de hoje estiverem mortos, o nome brasileiro que vai ficar é o dele, Pelé, o maior atleta do século, o melhor jogador de futebol de todos os tempos, que foi lembrado com saudade por dois outros grandes jogadores, pelos que verdadeiramente entendem do riscado: Beckenbauer e Platini.

Infelizmente, o tempo não parou para que a festa em Zurique fosse perfeita. Aqui na Terra os problemas continuaram. O Rio, cidade partida, segundo a feliz (ou infeliz?) expressão de Zuenir Ventura, mostrou como fica quando fisicamente partida. Sem o Túnel Rebouças, a cidade parou. O caos, aquele inimigo figadal que anda rondando o Brasil, instalou-se na cidade. O que não impediu seu prefeito, o ex-blogueiro do DEM, de partir para a Guatemala, onde domingo haverá eleições. Cada qual com seu cada qual, já disse um dia o presidente Lula. E, se a paixão do presidente é futebol, a do prefeito são eleições. Ele adora acompanhar uma campanha, uma boca de urna, aquela movimentação cívica. Lá foi ele. O Rebouças estava em boas mãos. Aliás, nas mesmas de antes do desabamento. Mas isso é detalhe.

O caos não descansou. Partiu para cima dos aeroportos, mais uma vez. Agora parece até implicância. Tudo bem que o caos tem que ser devastador e gélido, mas sentir saudade do Zuanazzi, é demais. Pega mal até para o caos. O presidente da Infraero – outro! – pediu aos passageiros para que não viajassem em horas de pico. Ele não sugeriu, mas eu sugiro. Em vez de viajar nas tardinhas de sexta-feira ou de domingo, expliquem aos seus patrões que vão fazer como Suas Excelências, os parlamentares: ida às terças e regresso às quintas. Pronto. Resolvido o problema.

Mas esse caos, apocalíptico por natureza, o que fez? Criou uma quizumba no setor do gás. Ontem, tomei um táxi conhecido aqui do ponto. Homem gentil, sempre abre a porta do carro, se assegura que estou bem instalada e, ao mesmo tempo em que liga o carro, entabula um papinho. Ontem, nada. Silêncio absoluto. Senti o clima. Também caí numa esparrela parecida. Em 1984, comprei meu primeiro carro a álcool. Eu acreditei. O motorista acabou falando: ouvira a declaração do presidente – ainda outro...- da Petrobrás. O senhor Sergio Gabrielli aconselhava que se procurassem outras fontes de energia.

Mas, como para o brasileiro, pouco nunca é suficiente, fomos pedir ao caos que atendesse um outro lado de nossas vidas: a política. A CPMF é vital, segundo o Governo. Sem ela, adiós, pampa mia! Como ela está para ser prorrogada e tem sido objeto de uma luta animada entre situação e oposição, para dar um colorido extra e mostrar ao povo quem é o dono da bola e do campinho, o PT arma um terceiro mandato e o ministro Paulo Bernardo, num primor de senso de oportunidade, lança a idéia de uma contribuição permanente. ‘Contribuir para sempre’. Chega a dar calafrio...

O deputado pernambucano Fernando Ferro, petista, claro, veio em ‘socorro’ do presidente e da CPMF:

- Tudo não passa de um jogo oposicionista para levantar debate em torno do assunto e indispor o governo frente à população, o que pode gerar resultado contrário e o presidente Lula ficar ainda mais popular. A oposição pode estar acordando um dragão. (Fonte: este blog).

Foi aí que compreendi nosso hino: o gigante deitado em berço esplêndido é um dragão. Movido a gás natural boliviano. Expele grossas labaredas quando está furioso. Precisamos acalmá-lo e logo. Soube que o presidente Lula brincou com Platini que o Brasil poderia ter participado da Copa da França por ser vizinho de terras francesas, a Guiana. Então vi a luz. O presidente do Brasil deve pegar aquele envelope que o presidente da FIFA lhe deu e enviar dentro dele um convite para que La Paz , capital de terras vizinhas, seja a 13ª sede da Copa de 2014. Desde que, etc. etc.

*
Hoje descobri que Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa é fiha de Adoniran Barbosa; professora e tradutora, constantemente publicada por Ricardo Noblat.

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