"Deus me respeita quando eu trabalho. Mas me ama quando eu canto."

terça-feira, março 31, 2009

Grandes Mulheres do Brasil – Ruth Cardoso

Ruth Correia Leite Cardoso, nascida Ruth Vilaça Correia Leite (Araraquara, 19 de setembro de 1930 — São Paulo, 24 de junho de 2008) foi uma antropóloga brasileira e professora da Universidade de São Paulo.

Doutora em antropologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Ruth Corrêa Leite Cardoso foi pioneira no reconhecimento da emergência, na década de 1970, dos movimentos sociais que abrigavam minorias por questões de gênero, étnico-raciais ou de orientação sexual. O trabalho da antropóloga pôs em pauta a pesquisa sobre esses movimentos no meio acadêmico brasileiro.

Desde 1953, Ruth era casada com Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do Brasil, com quem teve três filhos. Sempre rechaçou o título de primeira-dama.

Criou e presidiu, durante o mandato de seu marido, o programa Comunidade Solidária, de combate à exclusão social e à pobreza, dentro de uma perspectiva emancipatória. Em 2000, criou a Comunitas, organização não-governamental, visando dar continuidade às atividades do Comunidade Solidária.

Morreu no dia 24 de junho de 2008, em sua residência, em decorrência de problemas cardíacos, um dia após realizar cateterismo cardíaco e receber alta hospitalar.

Formação acadêmica

Doutora em antropologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), atuou como docente e pesquisadora na USP e em várias instituições universitárias de diferentes países - Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso/Unesco), Universidade do Chile (Santiago do Chile), Maison des Sciences de L'Homme (Paris), Universidade de Berkeley (Califórnia) e Universidade de Columbia (Nova Iorque).

Era membro associado do Centro para Estudos Latino-Americanos da Universidade de Cambridge (Inglaterra) e membro da equipe de pesquisadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap - São Paulo).

Publicou vários livros e trabalhos sobre imigração (especialmente a japonesa), movimentos sociais, juventude, meios de comunicação de massa, violência, cidadania e trabalho.

"Uma mulher incomum

Dora Kramer

A principal característica de Ruth Cardoso como mulher de presidente da República era ser peculiar, diferente de todas as antecessoras.
Discreta, não poderia ser comparada às submissas; atuante, nem de longe lembrava as intrometidas; austera, guardava distância das puritanas; severa, não se enquadrava no modelo das intolerantes; refratária ao cotidiano da política partidária, estava a léguas das alienadas; impecável no pentear e no vestir, nem por isso formava no rol das entusiastas da ostentação.

Ruth Cardoso tinha a veleidade de preservar sua identidade como cidadã comum, mas, no que tange à Presidência da República, sem dúvida foi uma mulher incomum. Com todos os ônus e os bônus contidos na definição.

No início, mais ônus que bônus. Brasília e a mulher do novo presidente se estranharam. A capital nunca tinha visto nada parecido.

Se Fernando Henrique Cardoso com suas maneiras apuradas e fala de acadêmico já parecia esquisito, algo presunçoso, quem diria a mulher, mais interessada na carreira de observadora ativa da vida brasileira do que nas alegorias do poder, sempre preparadas para dar curso ao exercício da bajulação.

Com Ruth não seria assim.

Uma intelectual internacionalmente reconhecida que não escondia sua ojeriza aos rituais do poder e uma especial antipatia por jornalistas, fossem eles interessados em detalhes fúteis ou estivessem sinceramente empenhados em ouvir o que a professora, mestre, doutora e escritora tinha a dizer sobre os destinos do País.

Ruth chegou a provocar um contido escândalo quando, depois da eleição e antes da posse, cogitou da hipótese de não se mudar para a capital. Queria ficar em São Paulo, levando "vida normal".

A corte sentiu-se rejeitada. Enxergou antipatia, soberba e um resquício de impertinência na novidade da rejeição ao título de "primeira-dama". Ruth não dizia com todas as letras, mas estava claro que achava a denominação antiquada e, sobretudo, cafona.

Tinha toda razão. Nem por isso, entretanto, insistiu na imposição de novas leis. A recíproca foi verdadeira e, aos poucos, os espíritos foram se desarmando. A capital desistiu de enquadrar Ruth nos parâmetros conhecidos e ela, enquanto fazia concessões na forma, conquistava respeito na exposição do conteúdo.

Falava pouco, mas era sempre certeira na análise dos problemas brasileiros, não abria mão das opiniões, ainda que polêmicas, aliava-se ao bom combate e, como não precisava, como o marido, fazer concessões inerentes à condição do governante, Ruth Cardoso foi se firmando no cenário nacional como um símbolo de dignidade e correção.

Os políticos aliados ao governo do marido logo perceberam o potencial eleitoral contido nessa boa figura, tentaram discretamente conquistá-la como parceira de palanque, mas Ruth, naquela firmeza típica dos seres lastreados em ouro, não se deixava seduzir por bobagem.

Mais importante para ela eram as discussões, as elaborações e as projeções de programas sociais distanciados do assistencialismo e sustentados na concepção da inclusão produtiva. Jovens, por exemplo, não recebiam dinheiro, mas incentivo para aprender profissões ao alcance das suas realidades: DJs, dançarinos, cabeleireiros "afro", etc.

Livre das regras do jogo bruto da política cotidiana, Ruth preservou as antigas relações e construiu novas admirações entre partidos de todos os matizes. Distante do ambiente de denúncias, de escândalos, fiel a suas convicções sem ceder à tentação de extrapolar para o papel de heroína, foi naturalmente sendo vista como uma espécie de reserva moral não explícita, consciência crítica do governo.

Aquilo que no começo causou estranheza - uma simplicidade vista como majestática, a aversão ao estrelato, o retraimento, a fidelidade à conduta da vida inteira - acabou sendo visto pelo Brasil como sua melhor qualidade: a noção de que ocupantes do poder são apenas cidadãos aos quais se confere temporariamente a prerrogativa de fazer acontecer.

Isso não lhes dá o direito de se acharem diferentes dos demais ou mesmo diferentes de si mesmos antes do advento da votação, ao ponto de justificar a adoção de artifícios para marcar a distância entre representantes e representados.

Ao preservar sua naturalidade, Ruth Cardoso marcou pela peculiaridade. Em sua cerimônia de adeus, reuniu o pesar dos partidos, das entidades, das sociedades, das instituições, algo inédito em se tratando de mulheres de presidentes.

Mais inusitado ainda porque o presidente em questão está fora do poder. Quem se manifestou, portanto, o fez pela figura de Ruth Cardoso e tudo o que ela conseguiu representar.

Simbolismo resumido nas inquietações que lhe assaltavam a alma: a degradação dos costumes, a total indiferença aos princípios éticos, a passividade da população diante desse quadro e, para citar palavras ditas por ela em setembro de 2007, "o mais incrível é que ninguém é punido, fica tudo por isso mesmo".

estrela dourada

Primeira e Única


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